Polivalência e decadência da escola
Desde os remotos tempos da Academia ateniense fundada por Platão, as escolas foram consideradas lugares de excelência sapiencial, intelectual e cognitiva. Daí advem a dignidade com que estes espaços de formação têm sido encarados ao longo dos séculos.
Mas a tradição já não é o que era e, se em certos assuntos, a reformulação e até eliminação da tradição se justifica (escravatura, pena de morte, homofobia, etc.), outros há em que querer mexer no legado herdado só pode ter trágicas consequências culturais. Ora, é o caso do modo como a privatização em curso de serviços públicos básicos que o Estado devia prestar - na saúde, educação, justiça - leva à destruição de valores elementares, como o da justiça social, da equidade e da igualdade de oportunidades. Nesta voragem capitalista e neoliberal que se nutre de uma sociedade massificada e desprevenida, a escola é uma das instituições sociais que mais tem sido penalizada pela mudança de paradigma.
Em Portugal, a imagem da escola vai-se degradando quer pela mediatização frequente de casos de violência e indisciplina, quer pela implementação de políticas educativas pedagogicamente permissivas, facilitistas, irrealistas e desautorizadoras da autonomia e nobreza das funções docentes, com a crescente imposição e burocratização de tarefas e deveres, que agravam a escandalosa perda de direitos. Qualquer pessoa informada sabe que, em rigor, a escola pública no nosso país não está habilitada para cumprir cabalmente o objectivo formativo para que foi criada, com professores cada vez menos motivados e convertida que está em depósito ou armazém de crianças e adolescentes, muitos dos quais reflectem ausência de afectividade e deficitária interiorização de regras de convivência que as famílias a que pertencem não souberam transmitir, demitindo-se assim do seu papel de educação informal.
Mas é o próprio poder que tutela o ensino que se vai também demitindo das suas obrigações para com as exigências que impõe à escola, sendo um dos últimos episódios desta decadência o facto de muitas escolas portuguesas alugarem os seus espaços para eventos diversos do ensino, como (imagine-se!) casamentos e baptizados, que se constituem como fontes de receita para poderem funcionar. Aliás, na entrevista que deu à revista «Visão», na sua última edição, a ministra da Educação acha normal esse facto, que associa à autonomia das escolas e não à falta de adequado financiamento das mesmas. Nem sempre polivalência significa excelência!
A sinistra e inominável governante (não a nomeio para não poluir visual e eticamente este texto) chega mesmo ao ponto de dar este exemplo comparativo: "Vou só contar uma história que presenciei no Brasil. Era uma escola situada num morro e o espaço mais qualificado da favela. Era ali que se realizavam os baptizados e os casamentos." Este paralelismo é bem ilustrativo da desconsideração e do desconhecimento que a dona tem pela instituição que devia tutelar condignamente. Mas, afinal, sabemos que, hoje, analfabeto não é o que não sabe ler; e, por outro lado, como esperar mais de um governo chefiado por um obscuro e nada exemplar pseudoengenheiro?
Etiquetas: Sociedade
1 Comments:
Ai!!! Que ambiente tão alegre nas nossas escolas ...
Aiiiiiiiiii!!! Hã! Hã! Onde estou? ...
Ora, f...-se!
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