Saudades da «Gabriela»
Tinha eu sete tenros anos de idade quando, faz hoje 30 anos, a RTP estreou na sua grelha de programação um, à época, tipo inédito de entretenimento: a primeira telenovela da história da televisão nacional, «Gabriela, Cravo e Canela», baseada no belo romance homónimo da autoria de Jorge Amado e adaptado para televisão. A «Gabriela» representou uma revolução não só em termos de formato, aniquilando de vez as fotonovelas e as radionovelas, mas também de mentalidades ao introduzir um choque nos costumes do país conservador, tradicionalista, rural e ainda em transição democrática, como era Portugal em 1977. Mais ainda tratando-se de uma narrativa de traição e adultério.
A bela Sónia Braga, no papel principal de entre uma galeria inesquecível de personagens, foi a primeira actriz brasileira a ter proeminente visibilidade no nosso país, encarnando a "Gabriela" e fomentando massivamente nos portugueses, de todos os segmentos sociais, o hábito de acompanhar um programa de TV, em doses diárias de 45 minutos, que reunia famílias à volta dos televisores e animava conversas em casa, no café, no trabalho, nos transportes ou na escola... É uma das poucas memórias de infância que guardo!
Nesse longínquo ano de 1977, a RTP era a única estação de televisão lusa, com dois canais e transmitindo ainda a preto, cinzento e branco (as outras cores viriam dois anos depois). Portugal vivia os tempos conturbados do PREC, em que a instabilidade social e as intrigas políticas dominavam os noticiários. Curiosamente, o próprio Conselho de Ministros de então suspendeu os trabalhos à hora da transmissão do último episódio, seis meses depois da exibição do primeiro episódio.
Trinta anos depois de «Gabriela», o dilúvio de novelas que lhe sucedeu e a exploração intensivamente industrial da fórmula, ocupando uma parte exageradamente grande das grelhas de programação dos canais de TV, esgotou a paciência de muitos que, entretanto, e com o advento de alternativas culturais (como clubes de vídeo, proliferação de shoppings e salas multiplex de cinema, aumento de estabelecimentos de diversão nocturna, etc.) deixaram de ligar a telenovelas. Em geral, o que hoje se televisiona merece um longo bocejo de enfado e, nisto de novelas, parece que não há amor como o primeiro: ah Nacib, que bela mulher tinhas!
Etiquetas: Sociedade
4 Comments:
Pois é, ALM! Que sorte tinha o Nacib!
Abraço.
Note-se. Durou 6 meses. A dar todos os dias.
Quanto duram as actuais?
Quantidade versus qualidade?
Que sorte tivemos nós em ver a Gabriela.
Que dirá isto da nossa evolução cultural. Ou é melhor nem pensar nisso ?
Olá Bernardo! Obrigado pelo comentário! Ainda bem que partilha comigo a nostalgia "gabriélica". Hoje a porcaria dos morangos açucarados duram anos e nem vestígio de qualidade...
Nisso Portugal retrocedeu.
Abraço,
ALM
Não estava em Portugal nessa altura.
Tenho dúvidas se estou agora, no entanto.
Abraço
MF
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