sexta-feira, novembro 23, 2007

Peixes fora de água

Em Portugal, mais de um terço da população activa tem um vínculo laboral precário e, com isso, de permanente tem a angústia de verem o seu sustento suspenso pelo frágil fio da imprevisibilidade. Tudo em nome da falaciosa saúde económica das empresas, que faz do trabalho com muitos deveres e poucos direitos uma questão de cidadania; quando, na verdade, as crescentes assimetrias e desigualdades sociais atestam que, nestes tempos de moderna servidão, o que sucede é a capitalista desvalorização social do trabalho e o desumano empobrecimento da autonomia individual e da dignidade cívica da grande maioria em favor de uns poucos.
Contrariando a farsa socrática (uma de muitas!) de se estar a adoptar uma estratégia política de qualificação profissional - «novas oportunidades», «plano tecnológico» e quejandos -, os números significam que uma parte substancial da nossa actividade económica dispensa a qualificação profissional dos trabalhadores, não gerando grande valor acrescentado (onde o desemprego mais cresce ultimamente é entre a população licenciada).
Curiosamente, segundo o relatório da «Proudfoot Consulting» sobre a produtividade nacional, estudo realizado pela Universidade de Warwick, os factores decisivos que contribuem para o atraso nacional, desperdiçando 7626 milhões de euros (5,5% do PIB), são a falta de planeamento e de controlo de quem dirige e a impreparação das chefias, quais peixes fora de água. Aliás, muito à imagem do Governo! Mas os comentadores de economia da nossa praça, nas suas habituais leituras convenientemente enviesadas dos números, atribuem genericamente a culpa ao desempenho dos trabalhadores - e face à precariedade crescente das relações laborais, como estranhar um eventual menor empenho destes?
Fossem tão competentes e diligentes nos seus desígnios empresariais como são a parasitar o Estado e a explorar os recursos humanos, e teríamos índices de produtividade bem melhores. Para quando um «choque psicológico»?

1 Comments:

Blogger Ai meu Deus said...

...e o governo promete (promete!) que irá dar às mulheres contratadas pelo Estado as "condições normais" de apoio à maternidade -- sem que o contrário seja considerado um escândalo pelo governo pê-èsse.

A precariedade (e o seu expoente máximo, o desemprego) deviam ser simplesmente proibidos (se a lei não estivesse do lado em que está -- se não defendesse quem se sabe que defende...).

10:06 da tarde  

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