quinta-feira, março 13, 2008

Em ninho de cucos / 17

Há uns quinze dias, li uma entrevista daquelas que não são apenas pretexto para promocional divulgação de uma mensagem e fátua exibição do entrevistado, servindo também para revelar a rude estreiteza de horizontes sobre o mundo, a vida, a sociedade e o homem. Refiro-me às declarações de José Policarpo ao semanário «Sol», em que, a dado momento, o luso capataz do Papa asseverou:
"Desde que se quebre o coeficiente de equilíbrio, a sociedade fica aberta a ser ocupada por gente vinda do terror e vinda do Ocidente e do Oriente como diz o Evangelho. O que faz com que seja previsível que, dentro de alguns anos, as sociedades europeias percam a sua fisionomia do ponto de vista religioso, do ponto de vista comportamental, cultural. Como se sabe, já há sociedades europeias a braços com a multiculturalidade e com a dificuldade de harmonia entre as diversas procedências da população, de que por um lado precisamos."
Se terror há, é o do conteúdo ideológico profundamente xenófobo que José Policarpo veicula, sustentado em pressupostos sem fundamento racional, ecuménico e humanista. O cardeal destas paróquias denota uma fervorosa simpatia pelos hediondos ideais de extrema-direita (não será ele filiado no PNR?), segundo os quais há que incrementar o coito que potencie a reprodução da nacional e europeia estirpe contra a «gente vinda do terror», piores que degenerados invasores marcianos, que ousam profanar o reduto cristão que caracteriza o edénico espaço europeu.
Esquece porventura o vaticano delegado que a igreja que representa invadiu, a partir da Europa, o mundo inteiro em evangélico genocídio cultural, impondo a ferro e fogo as suas falsas verdades pelos cinco continentes (e mais houvesse!), cúmplice das mais execráveis prepotências e arbitrariedades que envergonham a dignidade humana? E sente-se agora acossado pelos novos bárbaros que vêm de Oriente e de Ocidente? Até quando vão ter tempo de antena estes canhestros provincianos, para os quais os «estranhos» só devem pisar solo abençoado se for para trabalharem como escravos, "de que por um lado precisamos"? E o respeito pelos católicos de multiculturais paragens?
Antes estivesse esta asséptica gente preocupada com bem mais legítimas preservações, como a do lince ibérico ou da floresta amazónica... Saiba José Policarpo que «a gente vinda do terror», venha de Oriente ou de Ocidente, de Setentrião ou de Meridião, sejam cristãos ou não, são acima de tudo seres humanos tão terráqueos como qualquer papa-hóstia!

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1 Comments:

Blogger morffina said...

Fico aterrorizado quando este tipo vem-nos defender (os profes).

10:11 da manhã  

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