quarta-feira, abril 12, 2006

Da ingénua propensão para crer em milagres

Um recente estudo publicado na edição de Abril do Journal Of Paleolimnology conclui peremptoriamente que, ao contrário da ingénua crença difundida biblicamente, Yeshua Bin Yosef, mais simplesmente conhecido entre nós pelo mi(s)tificado nome de Jesus, terá caminhado sobre uma camada de gelo no mar da Galileia, ou lago Tiberíades, e não sobre água em estado líquido. Nessa época, num período compreendido entre há 1500 e 2600 anos, as condições meteorológicas nessa região da actual Israel eram particularmente rigorosas e, por conseguinte, haveria gelo suficientemente espesso para suportar o peso de um homem numa parte do lago Tiberíades.
Para explicar a ilusão de ver Jesus a caminhar em cima de água, registada e veiculada por três dos quatro evangelhos no Novo Testamento - qual livro de estórias infantis para incipiente senso comum! -, o principal autor deste estudo, o cientista Doron Nof, professor de Oceanografia na Universidade de Miami, afirma que, com a camada de gelo parcialmente coberta de água, observadores posicionados a alguma distância do "evento milagroso" não veriam o gelo e, por isso, poderiam acreditar que uma pessoa em pé ou a caminhar no lago estivesse real e profanamente deambulando sobre o elemento líquido. O que se perdeu em crua verdade ganhou-se em conveniente e engenhosa ficção criativa!
Já no início dos anos 90, o mesmo Doron Nof havia publicado um estudo segundo o qual a travessia pedestre do Mar Vermelho pelos hebreus conduzidos por Moisés, contada no Velho Testamento (outro interessante documento do género literário de Hans Christian Andersen ou Tolkien), pode explicar-se também cientificamente: tratar-se-ia, neste caso, de um outro fenómeno meteorológico no qual ventos moderados, a soprar durante vários dias no Golfo do Suez, tiveram por efeito afastar águas de fraca profundidade num muro de 2,5 metros de altura; depois, uma simples mudança na direcção dos ventos bastou para fazer desmoronar esse muro de água. E foi assim que, após a passagem da hebraica gente pelo Mar Vermelho, um exército de crueis soldados do faraó que a perseguia aí encontrou sepultura...
Depois de Copérnico, Darwin e Freud, não param de nos surpreender estas outras revelações que, não sendo de metafísica inspiração divina que nutre a ávida fé, são de racional fundamento empírico que nutre a procura da objectiva verdade. Em comum, têm o serem escritas pelas mãos do Homem. De diferente têm o sentido da visão com que se perscruta o real: é que, como se sabe e melhor ainda se entende, o maior cego não é aquele que não vê, mas sim aquele que não quer ver!

Etiquetas: