quarta-feira, dezembro 20, 2006

O caso 'Apito Salgado' ou os males da Justiça

É duvidoso que Portugal seja, plenamente, um «estado de direito», quando a opinião pública tem da Justiça uma crua imagem de ineficiência, parcialidade e confrangedora morosidade. Os julgamentos de casos amontoam-se e arrastam-se ao longo de penosos anos, acabando muitas vezes com o arquivamento dos mesmos (caso Camarate) ou em sentenças inócuas (casos Entre-os-Rios e Ferreira Torres) que ferem o exigível princípio de sancionar a inequívoca e comprovada ilicitude, morrendo a culpa solteira.
O poder dos média é inquestionável e é graças a ele que a mediatização de processos judiciais conduz a uma forma de pressão para, pelo menos, dar mais celeridade processual aos julgamentos. Por outro lado, a dimensão mediática dada a alguns casos contribui para os tirar do marasmo e hermetismo a que a máquina judiciária parece remetê-los. Os casos Casa Pia e Apito Dourado são prova disso, agravados pela complexidade de instâncias, testemunhas, causídicos e arguidos, numa teia tal, que leva a que o emaranhado labiríntico de depoimentos, recursos e sessões produzam um novelo inextrincável que se enreda sobre si próprio.
A justiça portuguesa funciona mal, não tem meios; as leis são muitas vezes omissas, ininteligíveis ou ambíguas e o interesse político dos partidos do governo em não combater a corrupção são males facilmente diagnosticáveis que concorrem para o atraso do país, pois daí advêm também consequências sociais e económicas. Foi preciso que a publicação de um livro de cariz delator desse novo impulso ao processo Apito Dourado - transformando-o mais num "Apito Salgado" - que, conjugado com a mudança de Procurador-Geral, demonstrasse à saciedade como a inoperância judiciária assenta sobretudo na ausência de vontade política e na falta de competência dos actores responsáveis pelo sector da justiça. Souto Moura foi o rosto da estagnação e irresponsabilidade e ficou mal na fotografia: Carolina Salgado não escreveu (ou alguém por ela), em rigor, algo que não se soubesse e/ou suspeitasse; e Maria José Morgado já existia e estava encostada na prateleira...
Mas, será que haverá resultados, ou Portugal vai converter-se numa imensa Felgueiras?

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