Referendar a IVG - 7ª parte
11. OUTRAS FALÁCIAS DOS MOVIMENTOS PELO "NÃO"
a) Com o referendo do próximo dia 11, não se pretende "liberalizar" o aborto, pois, vencendo o "sim", o mesmo só poderá ser realizado até às dez semanas e em estabelecimento de saúde autorizado. Invocar a "liberalização" como argumento contra a despenalização (que é o que se pretende com o referendo) é pura má fé, demagogia e desonestidade. Pelo contrário, nos actuais moldes é que a IVG está liberalizada e alimenta um mercado negro da saúde verdadeiramente escandaloso, haja dinheiro!
b) Os partidários do "não" incorrem na hipócrita aporia intrínseca da sua posição, a saber, querem a manutenção de uma lei (o artigo 140º do Código Penal) que criminaliza o aborto, mas não dizem clara e inequivocamente se as mulheres que o praticam ilegalmente devem ou não ir presas. Afinal, uma lei estabelece regras a cumprir e sanções, não tendo apenas um efeito sugestivo!
c) Parece que só quem defende o "não" defende a vida como valor fundamental, quando se sabe que não há consenso sobre se as diferentes fases de desenvolvimento embrionário, mormente as iniciais, têm ou não o mesmo estatuto dado à vida após o nascimento. É a dogmatização do conceito «vida» que retira lucidez à discussão, acabando mesmo os ditos "pró-vida" a discutir o que dizem ser indiscutível!
d) Os defensores do "não" defendem que a vida humana começa desde o momento da concepção e, portanto, o feto é um ser humano desde o zigoto primordial e tem direito inalienável à vida; simultaneamente, argumentam que a lei em vigor é boa. Porém, a mesma estabelece, entre outras excepções, que a IVG é permitida até às 16 semanas (!) se resultar de acto de violação.
Mas, então, como compatibilizar aquele princípio do direito à vida com a defesa da actual lei? Não será que há "mais vida" às 16 semanas do que às 10? Ou o feto que resultou de uma violação tem "menos vida"?
Os defensores do "não" criam as aporias em que se enredam e incorrem em infeliz contradição.
e) Os movimentos anti-IVG dizem reprovar a ideia de o dinheiro dos contribuintes ser canalizado para o Serviço Nacional de Saúde (SNS) efectuar abortos. Mas que dizer das despesas do SNS com as complicações que resultam de abortos clandestinos mal realizados? Além disso, eu também reprovo que o dinheiro dos contribuintes sirva para pagar a juízes, tribunais e prisões para dar cumprimento a uma lei iníqua como a actual e para muitas outras coisas com as quais discordo...
Aliás, despenalizar a IVG até às dez semanas e realizá-la em estabelecimentos do SNS potencia o acesso para intervir junto das mulheres, sobretudo das adolescentes (30% das mulheres que abortam em Portugal!), permitindo prevenir reincidências de IVG e complicações pós-aborto.
Está nas mãos dos portugueses, através do seu voto no "sim", combater a inércia política e o atavismo de preconceitos e mundividências retrógradas e irrealistas. Será que os eleitores deste país saberão estar à altura? A julgar por outros sufrágios, penso que não... Oxalá me engane!
Etiquetas: Política
2 Comments:
Os "partidários" do não argumentam que não se trata de um direito ou de uma escolha, mas de um conflito de interesses.
Há um conflito de interesses entre a liberdade de opções da mulher, do interesse do embrião, e até mesmo do interesse pai. Obviamente não têm pesos iguais, obviamente um ovo não é um galinha. Agora também não se pode assobiar para o lado e fingir que o Pai e o embrião não existem, nem fazem parte da equação.
Há situações em que é imperioso a IVG, e é de facto o "mal menor"? Sim! A própria Lei actual prevê as principais, talvez haja mais exclusões a incluir. É um tribunal que decide? Não! Na Lei actual são os médicos que acompanham as mulheres que as auxiliam na avaliação da situação.
Vou ser chocante e usar o exemplo alemão. Alguém é obrigado a andar a 220km/h só porque não há limite de velocidade? Não, mas lá que andam, andam! Talvez seja por isso que cada vez há menos troços de auto-estrada sem limite de velocidade na Alemanha, e talvez seja por isso que a IVG tem sido revista por forma a introduzir mais restrições nesse mesmo país.
Obrigado Carlos pelo excelente comentário! Noutra parte da minha argumentação, referi que a questão da IVG é dilemática, não havendo posições ideais, pois todas comportam aspectos positivos e negativos. Portanto, há que pesá-los e ver onde abundam mais aspectos positivos para tomar a necessária decisão. Nesse sentido, parece-me que os argumentos a favor do "sim" são mais plausíveis e daí a minha escolha. A liberdade e a qualidade de vida também devem ser valores prioritários.
Abraço e obrigado pelo comentário!
Bom fim-de-semana!
ALM
Enviar um comentário
<< Home