O precariado activo
O anúncio de projectos de investimento empresarial ou de construção de infra-estruturas, públicas e privadas, é normalmente acompanhado de um demagógico indicador particular e habitualmente inflacionado: o número de postos de trabalho que a concretização de tais projectos vai gerar. Convenientemente, porém, não se refere nem o consequente número de desempregos que potencialmente implica nem a qualidade precária do vínculo laboral dos novos empregos gerados, que são o efeito inevitável das dinâmicas concorrenciais em que se baseia a economia capitalista.
É nesta lógica do lucro a qualquer preço que o princípio da «flexigurança» parece querer impor-se, agravando a instabilidade no mundo do trabalho e enfraquecendo impiedosamente direitos e garantias básicos dos trabalhadores. Se, antes, o escravo era propriedade durável do senhor, hoje, o novo escravo é mero recurso sazonal a descartar pelo patrão quando lhe aprouver e sempre que, pretensamente, o sistema produtivo o justifique. Quando está activo, o empregado deve dedicação total ao ofício (flexibilidade, mobilidade e polivalência) com sacrifício crescente da sua vida pessoal e familiar; mas, quando está na situação de desempregado, fica entregue à sua sorte e a critérios de recrutamento tantas vezes indignos e obscenos, bem como à chantagem de ofertas salariais niveladas por baixo e longe das mais-valias que ajuda a realizar.
Actualmente, a precariedade laboral é um facto social tido como consumado e materializado, por exemplo, por contratos individuais de trabalho a termo certo e pagos a recibos verdes, sem direito a subsídio de desemprego ou por doença, nem beneficiando do direito a subsídio de férias e de Natal. E, embora o regime em que se colecta coloque este tipo de trabalhador no grupo de "trabalhadores independentes", ele não passa de mais um utensílio nas mãos do contratante, com horários dilatados e hierarquias laborais a cumprir. Além disso, em muitos casos é beneficiário permanente da entidade para quem presta a actividade.
Portanto, e em rigor, cada vez mais se revela desajustado da realidade falar em "população activa"; melhor será falar em «população desactivada» e em «população superactiva». Tudo isto existe, tudo isto é triste, tudo isto é mercado!
1 Comments:
Não será antes o paraíso?
Não me parece ver as pessoas dispostas a fazer algo pelos seus direitos.
Agora o que me preocupa é a precariedade dos empregos dos assessores da Câmara Municipal de Lisboa. Se fossem todos despedidos, poderíamos ter um colapso social!
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