segunda-feira, novembro 26, 2007

Quem dá porrada à ministra?

Noticia o jornal do sr. Fernandes que "funcionários não-docentes são vítimas diárias de agressões nas escolas". Como professor a leccionar numa escola problemática, eu próprio sou testemunha directa da veracidade do conteúdo da notícia.
Com efeito, o fenómeno da crescente indisciplina nas escolas indicia, desde logo, quão grave é a demissão dos agentes de socialização (família, tecido produtivo, meios de comunicação social e de entretenimento, etc.) no processo de socialização que seria recomendável legar às gerações mais novas. Pelo contrário, e também por factores sócio-económicos e culturais adversos e diversos, nivela-se cada vez mais por baixo, descuidando-se a elevação sapiencial, a curiosidade intelectual ou a excelência cognitiva.
A perda de respeito pelos pais, pela família e, em geral, pelos mais velhos reflectem-se na escola, a qual, cada vez mais, tem de substituir a falência da família no domínio da educação elementar e informal, o que constitui tarefa impossível, inexoravelmente inglória e que extravasa o âmbito estrito de competências da escola. Mas, convenhamos, não se pode exigir a famílias desestruturadas que dêem o que não têm: entre outras coisas, as regras de civilidade que elas próprias não receberam e até desconhecem.
Se, actualmente, devido a leis permissivas e iníquas (que perversamente reforçam a impunidade dos alunos), os professores se vêem em sérias dificuldades para imporem a autoridade na sala de aula, imagine-se o que dizer dos auxiliares de acção educativa, que, tendo também que lidar com a indisciplina, ocupam um lugar hierárquico inferior, são miseravelmente remunerados e muitos deles não têm sequer preparação prévia ou formação adequada para exercerem o seu papel na escola...
Face à massificação do ensino, não se criaram os mecanismos apropriados para substituir a escola tradicional e o ensino magistral e, confundindo direitos e deveres e pedagogia e puericultura de algibeira, procedeu-se à subversão total de valores: o carrasco passou a vítima e a vítima a verdugo, não havendo até hoje um ministro da pasta digno do cargo - a actual titular é o paradigma do pedagogicamente inqualificável (não se guardam galinheiros com raposas!) -, chegando-se a esta execrável situação em que o educando é incompetente para passar a educador, pois lhe falta educação (em sentido lato) e tempo para exercê-la!
Neste processo, as associações ou comissões de encarregados de educação estão para a escola como a gasolina para um incêndio ou o tocinho para Maomé; é que não basta mandar, é preciso saber mandar: onde estão as denúncias dos «encarregados de educação» (curiosa designação, tão erudita quanto falaciosa) à farsa efectiva que é hoje a Educação pública em Portugal? Onde estão as críticas à indisciplina na escola? Quantos pais há que, efectiva e seriamente, desempenham o consciencioso papel de «encarregados de educação»?
E, em todo este contexto, diz a ministra e os seus acólitos de ministério que as escolas são os lugares mais seguros que existem. Quem dá porrada à ministra? Pelo menos, e descontados os hematomas (milhares de professores e auxiliares sei que não os lamentariam), poderia ter o positivo efeito de despertar para a realidade e acabar com o arrogante e ignorante afrontamento. Ou, ao menos, à falta de porrada, apetece dizer à dona Lurdes: "por que nó te callas?"