terça-feira, outubro 10, 2006

Os sensacionalistas erros de paralaxe jornalísticos

Quem habitualmente conduz nas estradas portuguesas, não se surpreenderá se souber que há, entre outros, condutores sem carta de condução, ao volante de carros sem seguro e/ou sem inspecção, muitas vezes conduzindo alcoolizados e em viaturas roubadas, tantas e tão graves são as infracções cometidas e enorme a falta de civismo. Felizmente que, em certos casos, a autoridade policial intercepta estes criminosos sobre rodas, como aconteceu na última semana em duas ocorrências amplamente noticiadas, ambas na área metropolitana do Porto.
Porém, o desfecho das mesmas implicou o recurso a armas de fogo por parte de militares da GNR, para neutralizar as fugas perigosas encetadas por jovens marginais que, com os seus actos criminosos, puseram em risco a segurança e a integridade física e patrimonial de pessoas e bens nos locais por onde violaram ostensiva e sucessivamente elementares regras do Código da Estrada e desobedeceram às ordens de paragem dos policiais perseguidores. Como resultado, quatro jovens foram baleados, tendo um morrido de imediato e três estão, ao que consta, em estado crítico.
Claro que é preciso apurar responsabilidades e que se faça um completo esclarecimento das trágicas ocorrências. Mas o modo como a comunicação social fez a cobertura noticiosa, sobretudo a imprensa e a televisão (com directos à porta de tribunais e entrevistas a familiares e amigos dos fora-da-lei), é parcial e indutor de juízos de valor que sugerem uma análise emocional dos factos: até parece que os militares da GNR são assassinos que tiram injustificadamente a vida a gente inocente!
Se, durante as fugas, os fugitivos provocassem uma desgraça e não fossem detidos, então as forças policiais seriam mais uma vez alvo de críticas pela ineficiência e impotência em matéria de garantia da segurança dos cidadãos. Preso por ter cão e preso por não ter, temo que incidentes deste género incutam nos guardas e polícias (já de si desmotivados pelos baixos salários, más condições de trabalho e, diga-se a verdade, impreparação de muitos deles para usarem armas e agirem convenientemente em situações delicadas e sob stresse) uma progressiva atitude de desleixo e indiferença - a que por vezes já se assiste! -, que faz perigar a preservação do Estado de direito e o respeito pela autoridade e pelo seu exercício. E não é preciso ter paranóias securitárias para recear o crescimento do sentimento de insegurança...
Tal cobertura jornalística insere-se no que designo de "estratégia TVI", assente num sensacionalista erro de paralaxe que consiste em tornar a sóbria difusão de efectivas notícias em filmes de acção sanguinolentos ou fait divers sem qualquer pertinência. Pena que haja acéfalos incautos e distraídos que são afectados e deixem de discernir entre o essencial e o acessório, aderindo à piedade pelos fora-da-lei que nutrem a faca e o alguidar do decadente jornalismo que pulula na demanda de audiências. Afinal, que direito têm os agentes da autoridade em andarem armados e a perseguir desobedientes condutores de carros roubados, sem seguro nem inspecção, e na posse de haxixe? Direito não têm nenhum - têm o dever!

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2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Cuidado! Os deveres podem traumatizar "os meninos"!

Parece que só existe autoridade num determinado sector muito reduzido da nossa sociedade.

Mais vale deixá-los "fugir"! (como diz o outro)... "Esses, depois de prestarem contas" ... não os delinquentes, em circunstância nenhuma (na opinião de pessoas razoáveis).

Existe rigor e zelo a mais onde não deve existir e onde deve ...

Abraço
MF

12:15 da tarde  
Blogger Joana said...

Concordo com o post. Que ânimo terá um agente de autoridade sabendo que se agir e disparar contra um suspeito, quem passa a ser tratado como suspeito e eventual criminoso é ele próprio?!

3:21 da tarde  

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