sexta-feira, maio 26, 2006

Refutar a monarquia e nostalgias afins - 2ª Parte

Retomo a refutação da monarquia no ponto onde ontem a deixei na 1ª parte.
As pessoas devem ser escolhidas pelo mérito, conhecimentos, experiência e capacidades intelectuais que possam ter; é daí que deve advir a sua excepcionalidade. Aliás, os monárquicos de todo o mundo deviam, neste particular, aprender com o exemplo búlgaro e assim compreender que a república é inclusiva e a monarquia é exclusiva.
O melhor advogado da res pública só pode ser republicano e não um defensor da ordem de um só; alguém que é escolhido pelos seus concidadãos e de entre eles, com base em critérios plausíveis, como o percurso político e profissional. Sim, ser chefe de Estado é exercer um cargo político e um Presidente tem, em princípio, uma profissão e contribui para o PIB, não tem privilégios ou isenções fiscais nem orçamento de Estado especial que o desvincule dos sacrifícios que têm de ser de todos, sobretudo num país pobre, carenciado e falido como Portugal.
Os monárquicos, portugueses ou não, devem ter presente as razões por que a monarquia foi cedendo lugar à república democrática em tantos países no mundo, muitos com uma secular tradição real. É o caso de Portugal: o 5 de Outubro de 1910, uma das datas mais positivas e importantes da nossa história, deve-se essencialmente à desmobilização cívica dos partidários da monarquia, ao descontentamento e saturação por oito séculos de impasses, crises e insolvências. Curiosamente, ante e pós Olivença, ainda hoje é assim: o líder do PPM, Nuno da Câmara Pereira, diz de Duarte Pio o que Maomé não disse do toucinho, e por aqui se vê que na monarquia há uma ilusão de unidade e a que possa haver é imposta, hoje como em 1383-1385 ou em 1580. E ainda apregoam os régios apologistas que o rei é mais do que um símbolo da representação e da unidade do Estado...
Outro argumento falacioso é o de dar continuidade à própria história do país: «só um rei descendente dos fundadores da nacionalidade, melhor que outros, pode transportar na sua pessoa essa carga positiva necessária à auto-estima de todos nós.» Em primeiro lugar, esse argumento passadista e emocional, falho de racionalidade, serve igualmente para defender o regresso às tradições inquisitorial, esclavagista ou cruzadista; em segundo lugar, hoje já não há espadas, lutas a cavalo, sabres, mosquetes, bestas ou escudos, nem faz já sentido o «contra os canhões marchar», visto que o mundo e as mentalidades evoluem, procuram não se fixar em tradições inócuas. Por outro lado, não é consensual quem será o actual messiânico legítimo herdeiro do trono e descendente da primordial majestade afonsina, nem, creio, isso é relevante para quem tem mais pertinentes preocupações na vida. Em quarto lugar, a generalidade dos portugueses não relaciona, bem pelo contrário, a baixa auto-estima que possa ter com a pretensão de ter uma cabeça coroada - quem tem sede no deserto não pensa numa imperial fresquinha, mas em simples água!
Outro ambíguo argumento, invariavelmente falacioso, é afirmar salazarentamente que um «chefe de Estado Real que simbolize na sua família os valores da família portuguesa comum e, desse modo, seja mais facilmente sentido e ouvido pelos portugueses.» Ou seja, o rei seria uma espécie de pai, cujo paternalismo se dirige aos súbditos com "valores da família portuguesa comum" (?), excluindo os outros que não têm valores comuns. O que é que isso quer dizer? As mães solteiras, os casais que usam preservativo, os ateus, os não católicos ou os agnósticos, etc., seriam proscritos? O rei é um exemplo ou modelo de virtudes dos que estão desejos das certezas morais pretéritas?
Enfim, e para concluir, a proposta de um regresso ao passado é o anseio que uns poucos defendem, certamente patrocinados pela imprensa cor-de-rosa que se nutre das extravagâncias reais de monarcas, infantes, príncipes e consortes. Por mim, prefiro a república com todos os seus defeitos, que a monarquia com todas as suas (eventuais) virtudes!

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4 Comments:

Anonymous Anónimo said...

O pessoal ainda fala em Contos de Reis! Deve ser uma atracção pelos vedetas espontâneos ou natos que graça neste país. Fugi um pouco ao tema só para dizer que concordo contigo.

Abraço.

MF

11:08 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

À laia das muitas virtudes da monarquia, mormente, em ordem à valorização do imaginário colectivo que representa ou a que está associado, esta assenta num princípio perverso de que os homens não nascem todos iguais.

E noutro de que o colectivo vale mais do que o indivíduo. Falácia nacionalista ou não mas sempre perigosa, injusta e falsa. Comummente aceite ou não, é indiferente embora pertinente, mas não deixa de ser verdade.

Desta vez, concordo laica mas não "cidadanicamente".

5:38 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

ERRATA:

Onde está escrito: «que representa ou a que está associado» deve estar: «que representa ou que está associado», preferencialmente a «que representa ou a que está associada».

PS

Palavras de um republicano mas não anti-monárquico ou anti-monarquista se fosse o caso de ser brasileiro. Mas não sou. Não que seja o caso de fazer questão de não ser porque no (meu) BI surge nacional português...antes, cidadão do mundo e, daí, a minha maior proximidade ao republicanismo desde que não seja sinónimo de estupidez nacionalista. Mas, «venha o diabo e escolha», comum a ambos.

5:50 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

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12:48 da tarde  

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