terça-feira, setembro 26, 2006

A congregação de São Cifrão ou o Estado de cócoras

Os beatos confrades do capitalismo puro e duro reuniram-se pela segunda vez (um mal nunca vem só e às vezes repete-se!) no Convento do Beato, para mais uma convenção cujo propósito, tal como há dois anos, é fazer lóbi a favor do sector privado e anatemizar o sector público, identificando-o como o exclusivo responsável pelo atraso e decadência nacionais e entrave à produtividade, à competitividade e à flexibilidade, a santíssima trindade da perspectiva neoliberal tão difundida pelo paradigma das políticas económico-financeiras protagonizadas pelo G8.
A levar a sério as propostas dos endinheirados administradores, gestores, bancários, empresários, académicos e demais membros deste conclave (estranho não haver gente carenciada no seio de tão benemérita, ilustre e influente corporação), Portugal passaria a ser visto como uma grande empresa com fins lucrativos e os portugueses passariam a ser seus clientes e funcionários a recibo verde e avençados, e já não cidadãos... O Compromisso Portugal insere-se num quadro de valores ideológicos vincadamente de direita (fazem até dos militantes do PSD e do CDS simples meninos de coro ou aprendizes de direita), em que, por detrás de uma aparente preocupação social e sensibilidade humanista, se esconde e prevalece a lógica economicista consubstanciada na defesa de uma política de despedimentos e privatizações em grande escala, que reduzem o Estado a uma dimensão apenas simbólica e minimalista: os arautos deste beatífico movimento propõem coisas como a alteração do actual modelo de Segurança Social, baseado num sistema de repartição, para um sistema de capitalização (que, é claro, favorece os mais favorecidos); a introdução de gestores nos tribunais e o aumento da quota de escolas privadas de 12 para 25% (a Educação é, acima de tudo, um negócio e não um serviço!); a redução de 200 mil (!?) funcionários públicos (quando o número destes, em Portugal, não é superior ao de muitos países desenvolvidos da OCDE), confundindo excesso de efectivos com irracionalidade na distribuição dos mesmos pelos vários serviços públicos; ou a privatização da CP, da APL, da TAP e da EDP...
É pôr o Estado de cócoras e reduzido a uma insignificância subserviente em sectores vitais, que despertam o voraz apetite da congregação de São Cifrão!
Estas miríficas soluções para Portugal recordam-me as palavras mordazes e de incontida raiva que, no volume 3 dos seus «Cadernos de Lanzarote», José Saramago dirige aos apologistas desta cartilha capitalista e que, permitam-me, gostaria de partilhar:
"(...) privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu, privatize-se a água e o ar, privatize-se a justiça e a lei, privatize-se a nuvem que passa, privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno e de olhos abertos. E finalmente, para florão e remate de tanto privatizar, privatizem-se os Estados, entregue-se por uma vez a exploração deles a empresas privadas, mediante concurso internacional. Aí se encontra a salvação do mundo... E, já agora, privatize-se também a puta que os pariu a todos."

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sexta-feira, setembro 22, 2006

Primum vivere deinde philosophare - 16

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quarta-feira, setembro 20, 2006

«Políticos, Caciques e Outros Anátemas» - 12º Acto

O recente pacto para a reforma da Justiça, acordado entre José Sócrates e Marques Mendes, é mais um daqueles dilatórios exercícios políticos que, a trazer algo de novo, reforçará o reinante estado letárgico de coisas com que PS e PSD têm desbaratado oportunidades de em Portugal reabilitar o importante sector da justiça e destruído a sua efectiva qualidade e eficiência. E isso deliberada e convenientemente, pois não foi por acaso que temas como a corrupção, o branqueamento de capitais e o crime económico ficaram excluídos do âmbito desse acordo privado; são matérias sensíveis que implicam directamente ambos os partidos do arco de governo, na figura de destacados militantes rosa e laranja envolvidos num extenso rol de casos que envergonham a Democracia e a correlata Justiça (Isaltinos, Valentins, Fátimas, Gomes, Varas, Patrões, Jardins, sucessivas contas partidárias reprovadas pelo Tribunal de Contas, tachos, cunhas, etc.).
E que ridículo ficou Alberto Costa na fotografia onde não chegou a estar, o patético e inócuo ministro da Justiça (?), que não só ficou de fora da assinatura do negócio, como o teor do mesmo contraria frontalmente ideias suas para o sector, que há meses veiculou mediante declarações na comunicação social.
Portugal é um estado de pacífico e tácito nepotismo democrático, um quintal na posse consuetudinária das perspectivas políticas neoliberais de PS e PSD. Com pactos deste cariz, onde o mais relevante a reformar fica de fora, não é de estranhar que o Departamento Central de Investigação e Acção Penal (DCIAP) tenha desistido de um estudo nacional sobre a corrupção por falta de verba, funcionando num edifício-sede sem salas suficientes para interrogatórios, consultas de processos e instalação de trabalho de peritos, num empobrecimento de recursos similar à asfixia orçamental da Polícia Judiciária; nem que, face ao caso Mateus, que indicia haver clara e objectivamente corrupção e favorecimentos vergonhosos no futebol português (e os do costume continuam impunes e imunes à justiça, arquivando-se os "apitos dourados" que abrangem 18 dos 25 árbitros da primeira categoria e um sem-número de dirigentes dos principais clubes), o Governo continua impávido e sereno a assistir ao desenrolar infrenemente sinistro e ininterrupto de revelações que descredibilizam o futebol (na réstia de credibilidade que ainda possa haver!), o desporto nacional em geral, os políticos e a imagem desta desditosa pátria nos confins da FIFA...
E que dizer de Souto Moura, o procurador-geral que coleccionou deslizes, inconfidências, contradições e asneiras afins, e que mesmo assim vai cumprir tranquilamente o seu irresponsável mandato até ao fim do prazo de validade?
Mas, como costumo repetir até à exaustão, estes políticos e dirigentes, que se enredam e acotovelam uns aos outros numa teia de sombrios interesses e clandestinas cumplicidades, não alcançaram o poder através de um golpe de estado, mas democraticamente, com o voto expresso e maioritário de um povo genericamente acéfalo, acrítico e preconceituoso, onde abundam oportunistas sem escrúpulos.
Quem seria o Presidente, o Primeiro-Ministro, os Secretários de Estado, os Deputados, o Procurador-Geral, etc., e como seria a República, se em Portugal houvesse justiça?

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segunda-feira, setembro 18, 2006

As bizantinices do Papa

O dogma católico da infalibilidade papal é uma daquelas produções teóricas que revelam o delírio demencial que se oculta por detrás da arrogância ortodoxa da igreja romana. Desta vez, e como mais uma prova de que um qualquer Papa é tão humano nas suas fraquezas psíquicas e viscerais como qualquer reles ditadorzeco de trazer por casa, Bento XVI, certamente iluminado pela luz divina (à atenção da EDP na busca de fontes de energia renovável!), decidiu citar um anacrónico imperador bizantino medieval, Manuel II, segundo o qual o profeta Maomé nada trouxe de novo, a não ser difundir a intenção de se defender pela espada a fé que se prega. Como o bispo de Roma até pode ser estúpido, idiota e/ou cretino, mas não é ingénuo, e dando contumaz sequência à nostalgia e saudosismo que deve certamente nutrir por práticas inquisitoriais que o seu comportamento denuncia (antes de ser eleito Papa, até foi o prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, o eufemismo com que desde 1908 a católica instituição designa o Santo Ofício de fogueiras passadas), Bento XVI sabia que a sua extemporânea indelicadeza e inoportuna insensatez iriam originar no mundo islâmico reacções de protesto e indignação, que podiam inclusivé pôr em causa a integridade física de muitos cristãos do mundo árabe. Aliás, é relativamente recente a polémica suscitada na Dinamarca com os cartunes alusivos ao arábico profeta.
Por conseguinte, Ratzinger é um provocador perigoso e um fundamentalista cristão, talvez cioso de fazer concorrência ao patético Bush (este deve estar grato ao Papa pelo acirrar das hostilidades entre judeo-cristãos e islamistas). Para cúmulo, a papal pessoa a quem chamam "santidade" desculpou-se com o tosco argumento de que a citação que fez não expressa o seu pensamento: então, por que citou o cristão imperador bizantino? Acaso desconhecerá a ignorante "santidade", chefe da legião de papa-hóstias, que também à Igreja a que preside se podem referir na perfeição tais aviltantes e bizantinas palavras sobre Maomé? O que dizer dos crimes hediondos que, com força cega e bruta, a igreja católica romana cometeu impune e arbitrariamente durante tenebrosos séculos de opressão e brutal tirania? Quem fez, afinal, jus às palavras do defunto imperador?
Caro Papa, limite-se a rezar o terço e quejandas ladaínhas de soteriológica aspiração; no mais, e para além de circunscrever as suas visitas à Polónia e ao seu querido país natal, faça um favor à Paz mundial: CALE-SE!!!

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sexta-feira, setembro 15, 2006

Legendar o silêncio icónico (15)

A ténue fronteira entre carícia e agressão...
(Será violência doméstica ou complexo edipiano?)

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quinta-feira, setembro 14, 2006

Primum vivere deinde philosophare - 15

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sexta-feira, setembro 08, 2006

Memórias da "silly season"

Há já tanto tempo sem vir aqui editar as minhas verrinosas reflexões sobre os dias que passam e que envolvem as quotidianas circunstâncias, que ora indignam ou confrangem, ora amenizam ou satisfazem... Terei ainda leitores para isto?
Porém, se repararmos bem, a marca da obsolescência não macula o lapso de silêncio que as férias suscitaram e a necessidade de descanso impôs, pois sob a espuma dos dias há um lastro de invariável imutabilidade que nunca desactualiza e que estrutura o curso dos acontecimentos: as matas e florestas que se convertem em pasto que alimenta a voragem das chamas, que impiedosamente lavram e consomem a pureza verde da paisagem e acinzentam a criminosa negligência ecológica nacional, acolitadas quer pela ineficácia de corporações de bombeiros mal preparadas e equipadas, quer por todos os enganosos planos de prevenção dos iluminados de dolo e idiotice a que chamam governantes (se vergonha houvesse, os Costas, os Simões e afins ter-se-iam ido embora para onde mais falta fizessem); os conflitos no Médio Oriente, com a incontornável troca de tiros, bombas, insultos e ameaças entre judeus e maometanos e com o velado beneplácito e cínico lamento de cristãos, com mais uma força da ONU plantada no mundo para disfarçar a indisfarçável farsa da apocalíptica diplomacia internacional; os assomos de perigo da Al-Qaeda e quejandas organizações tão terroristas como alguns estados, que mutuamente se alimentam no ódio visceral que esconde intentos outros (poder, território, influência política, dinheiro, petróleo, gás natural, água, testes de armamento, etc.), divulgando mesmo eficiência das suas polícias no desmantelamento de ataques dos aspirantes a bin Laden, quando, se calhar, a veracidade disso equivale à alegada presença de armas nucleares no Iraque de Hussein ou ao abate de um transeunte brasileiro no metro de Londres, para se mostrar serviço e colher os louros de uma meritória e vitoriosa identificação do terrorista procurado; os inconcebíveis foguetórios que adornam as parolas festas católicas, prenhes de barulho, falta de higiene, abundantes bebedeiras e música pimba em altos brados, tudo com a benção de pagãs "nossas senhoras" e "santos padroeiros" das mais estranhas coisas que a fértil imaginação dos pobres de espírito pode inventar e culturalmente instituir; as peregrinações alternativas que se fazem às praias, essas porções de areia congestionadas de pés e troncos estirados em solar defumação e rácica trégua (quanto mais preto mais bonito!), descanso apaziguador das intermináveis filas de carros e busca de estacionamento junto ao areal; os incontáveis animais domésticos que se encontram nas estradas, abandonados e mortos por atropelamento, cadáveres inocentes da insensível crueldade e maldade de indivíduos cujo comportamento devia ser punido com castração e vitalícia prisão (porque ser ela "perpétua" não o permite a humana mortalidade!); os programas de televisão a que chamam de "entretenimento" e que constituem um insulto à inteligência e dignidade cívica até dos pacientes do Magalhães Lemos, do Júlio de Matos, dos Covões, de Abraveses, etc.; as inevitáveis irregularidades que todos os anos se descobrem nos concursos de professores e que põem a nú a impune incompetência das sucessivas equipas ministeriais que contaminam a Educação e destroem irremediavelmente a formação dos cidadãos de amanhã e, logo, do país; o caudal de casos que inunda ininterruptamente a credibilidade do futebol e que comprova que o conluio dos dirigentes de clubes com árbitros é tão importante na obtenção do sucesso "desportivo" como treinadores e jogadores...
Todos os anos é o mesmo, num mimetismo das cícilicas sucessões naturais. Já agora, e por antecipação, em Agosto de 2007 os telejornais e os pasquins farão capas e manchetes destes conteúdos imperturbáveis de sazonal aparição. Precisa-se de um novo país, até de um novo planeta, e talvez daí o envio de sondas aos astros vizinhos! Mas isso não pode ser obra de gente velha...

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sexta-feira, setembro 01, 2006

Legendar o silêncio icónico (14)

O choque tecnológico já chegou até à mercearia da esquina!
(Está na moda a comida geneticamente modificada!)

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