quinta-feira, março 30, 2006

Crescei e multiplicai-vos!

O capitalismo selvagem vigente na China, que subordina todos os princípios de desenvolvimento sustentado à pura lógica do crescimento económico, está a ter custos elevadíssimos e terríveis para o meio ambiente. Como se isso não bastasse, uma explosão numa fábrica petroquímica, em Novembro último, provocou um derrame de umas quantas toneladas de benzeno, produto químico muito tóxico e cancerígeno, que poluiu um rio que atravessa uma grande quantidade de cidades chinesas, passa pela Rússia e desagua no mar. Esta contaminação é um problema global - é a globalização no seu pior...
Segundo ONGs, a China vive uma das maiores crises ecológicas do mundo: os cinco principais rios do país estão contaminados e nove das dez cidades mais contaminadas do planeta são chinesas; metade dos bosques deste gigante asiático intoxicado desapareceu e algumas povoações tiveram mesmo de ser evacuadas devido à falta de água potável e à contaminação. Além disso, o baixo custo do carvão potencia e facilita o seu continuado consumo e utilização, isto apesar de ser um foco de elevada contaminação.
O governo chinês já se comprometeu em reduzir as emissões poluentes em 10% durante a próxima década, o que, perdoe-se-me o cepticismo e o pragmático pessimismo, é impossível, pois a economia chinesa cresce quase 10% ao ano e tem uma população de 1300 milhões de habitantes. O facto de o governo tratar o tema, até mostra uma mudança de mentalidade, ou pelo menos o desejo de mudar. Porém, para uma grande parte da China e, logo, da Terra, tal desejo chega demasiado tarde!

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Planeta Chíndia

Os números são impressionantes e foram coligidos de um número recente da revista Visão: a China tem 1300 milhões de habitantes, uma população activa de 760,8 milhões e uma taxa de crescimento de 9,1%; por sua vez, a Índia tem 1080 milhões de habitantes, dos quais 482,2 milhões constituem a população activa, com 6% de taxa de crescimento.
Em 2050, as estimativas apontam para que ambos os países consumirão 72% da energia mundial, conduzirão 3 mil milhões de carros (cinco vezes mais do que a frota mundial hoje), terão 2300 milhões de computadores (dez vezes mais do que hoje os E.U.A.) e farão duplicar o consumo mundial de água. A China passará a ocupar o primeiro lugar do PIB (é actualmente sexta) e a Índia o terceiro lugar (é actualmente décima).
É mesmo um novo planeta que se forma dentro do planeta: é o planeta Chíndia!

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quarta-feira, março 29, 2006

Um monstro chamado Homem


Diariamente o mundo fica mais pobre - é o Homem que pensa enriquecer...
Do Homem se diz ser racional - é a forma de esconder a sua mísera irracionalidade...
Ao não humano se refere a bestialidade - é a projecção da sua brutalidade intrínseca...
São os carnívoros hábitos, dirão - não!, é a fátua vaidade sob a forma de odioso agasalho...
A maldade humana também se escreve com sangue gratuita e barbaramente derramado. O vil Homem mancha de execrável vermelho a nívea beleza e a natural inocência de um planeta em que prova não merecer viver...
No Canadá, e não só, começou a época da matança às focas-bebé. É uma prática cruel, é um processo que impõe um fim doloroso e tão prematuro a seres tão delicados, frágeis e de uma vulnerável candura, é o testemunho da fria e predatória insensibilidade humana, é a vergonha de fazer parte de uma espécie que se julga proprietária exclusiva da terrestre habitação.
O silêncio das imagens contrasta com o meu inconformado grito de revolta e a grande dor que sinto. O perigo não vem de Marte ou de ET's de estranhas paragens. O perigo mora na própria Terra, vem da contaminação humana, brota da sua genética insolência e especista arrogância...
O Homem é um tenebroso MONSTRO!

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terça-feira, março 28, 2006

Confundir a ave com a floresta


O ministro da Agricultura tem reiteradamente desdramatizado o dossiê H5N1, assegurando que, se o flagelo da gripe das aves atingir Portugal, há um plano de contingência devidamente elaborado e cujo modus operandi inclui a proibição de circulação nas zonas afectadas até um raio de três quilómetros e o estabelecimento de cordões sanitários de dez quilómetros, tudo isso acautelado coordenadamente com as forças de segurança.
Se é certo que, presumo eu, outros países tiveram já a experiência de accionar análogas soluções de emergência numa situação real de transmissão da doença, não deixa de surpreender a forma serena como o governo português, na pessoa de Jaime Silva, dá mostras de tanta segurança, tranquilidade e proficiência perante o constrangimento de um hipotético cenário de epidemia ocorrer efectivamente em Portugal. Nem parece que o nosso país é invariável e persistentemente assolado todos os anos por incêndios de grandes proporções que vão fazendo a história triste da delapidação do património natural português. E, que se saiba, os incêndios florestais não são causados nem por vírus mutáveis nem por aves migratórias! Aqui, é a irresponsabilidade que é imutável e a culpabilização que migra.
Que o exemplo dado pelo titular da agrária pasta não seja mais um exemplo de como o actual executivo manipula habilmente a opinião pública e finge convictamente resolver, quando o que de facto faz é disfarçar arrogantemente a sua impotência e incompetência. Oxalá o ministro António Costa siga o paradigma de sapiência do seu colega de governo e que, finalmente, o fenómeno humano de desleixo e loucura pirotécnica deixe de nos incendiar o mato e a paciência.
De outro modo, das duas uma: ou não há no mundo governo mais precavido e imbuído de atitude prudencial e sentido de eficiência que o liderado por José Pinto de Sousa, perdão!, José Sócrates quero eu dizer; ou este governo continuará a concorrer com Pinóquio e a adoptar medidas infelizmente reais e só adequadas a cenários eventuais de um mundo... virtual!

segunda-feira, março 27, 2006

Dia Mundial do Teatro


... que é, como quem diz, o dia de todos os seres humanos, homens e mulheres, pais e mães, novos e velhos, ricos e pobres, empregados e desempregados, simpáticos e antipáticos, doentes e saudáveis, escrupulosos e crápulas, bem sucedidos e frustrados, patrões e empregados, governantes e governados, etc. e etc.
É um lugar comum, mas pertence a alguma terminologia científica: no palco do mundo decorre a peça da vida, todos somos actores desempenhando múltiplos papéis. Só uma singular diferença se contrapõe, a saber, a incontornável ignorância sobre o fim individual e colectivo, ou o epílogo da milenária aventura sobre a Terra. Que bom representar de improviso e desconhecendo até quando a temida gadanha nos deixa pisar o palco!

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Estado dubitativo - 2

Na sua coluna «O Jogo das Palavras», da revista Visão de 16 de Março último, António Mega Ferreira escreve a abrir: "Especado, ao frio entranhado de Março, com alguns tímidos flocos de neve a ameaçar o temporal silencioso, (...)".
Ó homem, eu sei que carismou de «O Jogo das Palavras» a sua intervenção semanal, mas mesmo assim há-de um dia explicar como é que alguns flocos de neve, ainda por cima tímidos, podem ameaçar um temporal!? E, já agora, outra Mega dúvida: o que é um temporal silencioso? Será uma espécie de chuva seca, ou de cloreto de sódio doce?...

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sexta-feira, março 24, 2006

Bushices


Bushice - s.m. (de Bush + suf. ice) 1. Qualidade ou estado de idiota, parvo, imbecil, energúmeno, estúpido. 2. Atitude, acto ou comportamento terrorista, impostor, mafioso, injusto. 3. Procedimento ou dito de mentiroso, oportunista, cínico, hipócrita.
O Iraque é uma caricatura de Estado. O presidente estadunidense (e o povo que o reelegeu!) é responsável directo e primeiro pela violência extrema que, desde 2003, vai pautando o quotidiano daquele país traçado a régua e esquadro no quadro de uma errada e anacrónica geometria pós-colonial. Só por bushice se pode falar em "guerra-relâmpago" - lembram-se?
A ordem pseudopolítica, tirânica e facínora de Saddam só perturbou Bush pelo fim do alinhamento daquele na defesa dos interesses do imperialismo do país deste. Que eu saiba, a dinastia Saud continua a fazer das palavras "democracia", "igualdade" ou "liberdade", elementos lexicais estranhos à política na Arábia Saudita. E à ditadura sucedeu a anarquia e a exploração económica dos recursos iraquianos, à boa maneira da estratégia sanguessuga mascarada de altruismo.
Mas este é já um debate gasto, servindo este post apenas como desabafo pela irritação que me causa essa outra invasão que bombardeia o sossego, a tranquilidade e a paz de espírito, na comodidade, pacatez e recato domésticos. De manhã à noite, do pequeno-almoço à ceia, da alvorada ao ocaso, ou o escrúpulo impele a não ouvir/ver as notícias na rádio e na televisão, ou a insensibilidade que se vai criando leva a ver com indiferença os mortos e atentados do dia no Iraque como se fossem uma mera extensão dos filmes de acção, que nunca deixam também de estar em cartaz. Para obstáculo, já basta a chuva intensa e contínua que ao longo destes dias parece não querer deixar-nos rever o disco solar, impregnando todavia da adequada cinzenta soturnidade a tristeza e melancolia que adensa a vida social e política nacional.
A vida na Terra arrisca-se, cada vez mais, a ser uma perfeita bushice...

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quinta-feira, março 23, 2006

Efeito Tamiflu



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quarta-feira, março 22, 2006

Dia Mundial da Água

i) 1,1 000 000 000 de pessoas (20% da população mundial), maioritariamente da Ásia e da África subsariana, não tem acesso a água potável.
ii) Somente 2,5% do volume total de água na Terra é considerado utilizável para tarefas humanas.
iii) 90% do consumo de água deve-se à agricultura.
iv) Em virtude de falhas nos canais e tubagens e de ligações ilegais, 40% da água utilizável é desperdiçada.
v) 313 000 000 de africanos não têm serviços sanitários mínimos.
vi) Morrem 4500 crianças por dia devido à água insalubre e à falta de instalações sanitárias básicas.
vii) Morrem 2 000 000 de pessoas por ano devido a doenças relacionadas com a falta de água para beber ou para fins sanitários.
A lista não termina aqui... Infelizmente, e com estes dados, cada vez mais temos razões para atribuir no calendário um dia mundial a este elemento que, não tarda, suplantará o preço do petróleo e gerará em todo o mundo conflitos transfronteiriços de proporções e consequências por enquanto inimagináveis.
Será que ainda estamos a tempo de inverter esta situação? Façamos todos, sem excepção, por isso!

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terça-feira, março 21, 2006

Dia Mundial da Poesia (UNESCO)

Poesia é corpo de mulher,
é roteiro de delicado poema em recorte poroso,
mapa definido de todas as direcções imprecisas,
promessa de divino êxtase e ebulição, oculto vértice, púbica sagração.
Corpo de mulher - encruzilhada da poesia...
Poesia que é gota que desliza pela secura árida dos dias,
é a amarra cortada, a corda desatada, que extingue e dissolve o nó das rotinas;
lânguido movimento de sedução ociosa, bruma caprichosa,
brisa suave que acena à vida todas as doçuras do sentimento.
Subtil e tranquilo momento...
Com ou sem rima,
transborda como amplo universo de sensual estima,
analgésico que apazigua o ódio e a dor; nutre o amor e os prazeres anima,
grito mudo, contido e surdo, núcleo interior dormente,
diligência de espiritual alvura, luz diáfana luzente,
clareira da treva incandescendente,
sensível chama, brilho, movimento feito palavra presente.
Em ti convergem a distância e a proximidade, o tédio e a saudade;
De todos os nomes és matéria: Maria, Rosa, Ana, Sara... Adelaide!
Poesia será sempre, eternamente, o que a emoção disser,
hino de volições e fino instrumento,
etéreo pensamento,
feito poema, num corpo de mulher...

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OPA's, desemprego e vacas magras

Em menos de um mês, os portugueses assistiram a duas OPA's que, dizem, vieram revitalizar e dinamizar o diminuto e letárgico sector económico-financeiro nacional. O tempo em que ocorrem estas investidas de umas empresas sobre outras, em áreas extremamente lucrativas como são as telecomunicações e a banca, deve suscitar séria reflexão e análise. É o que aqui sumariamente proponho.
Indubitavelmente, a economia é um dos temas que genericamente tem ocupado a ordem do dia em Portugal com mais frequência e intensidade, nos últimos anos. No vocabulário quotidiano ouvem-se regularmente acrónimos que remetem para investimentos faraónicos de duvidosa pertinência e/ou premência (TGV's, OTA's, OPA's), o que comprova na prática como em tempo de vacas magras crescem as desigualdades sociais e, por outro lado, como o paradigma capitalista e neoliberal de criação, concentração e acumulação de riqueza é socialmente injusto no modo de distribuição da mesma. 1,4% do PIB são lucros de cinco bancos!
Simultaneamente a estas propostas de negócio inauditas e inéditas na magnitude de capital que envolvem, os dados divulgados pelo IEFP indicam que, no final de Fevereiro último, havia 487 936 pessoas inscritas nos centros deste instituto; mas sem trabalho certo havia 517 377 pessoas. Além disso, sabe-se que o endividamento das famílias atinge 118% do seu rendimento e as taxas de juro vão continuar a subir, provavelmente chegando aos 3% até ao final do ano.
Ora, a conjugação destes acontecimentos de sentido contrário levam-me a concluir que continuamos longe de realizar uma sociedade norteada por princípios de justiça social, em que o desenvolvimento se faça sustentadamente respeitando todos harmoniosamente. O rendimento de muitos traduz-se num óbolo em obsceno contraste com os milhões que fazem a fortuna de uns poucos e cujas OPA's dão a ilusão de beneméritas acções de repartição de riqueza, quando na prática acarretarão ainda mais desemprego e pobreza, ampliando o fosso entre ricos e pobres.
Não me parece aceitável esta via de estimular a economia, que subordina e sacrifica valores e direitos sociais básicos, fundamentais e estruturantes, à lógica do lucro puro e duro. Há que opôr resistência aos que veiculam a defesa da dominação capitalista, como Daniel Bessa, especialista em dislates vários como o que apregoou numa recente conferência em que fez a apologia do fim do subsídio de desemprego e a exclusão do emprego como prioridade de acção política de governo.
Mas se acreditarmos que não há mal que sempre dure e que certos males vêm por bem, pode ser que a dinâmica de mercado potencie ou a deslocalização destes senhores para oriente (há por essas bandas abundante mão-de-obra a preços de saldo) ou uma proposta de OPA sobre certos políticos, empresários e economistas, certamente ainda ávidos e recorrentes leitores do Tio Patinhas.

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segunda-feira, março 20, 2006

Estado dubitativo - 1

Nunca fui grande conhecedor de matérias geofísicas, pelo que hoje me surgiu a dúvida que espero alguém me possa esclarecer. Então, é assim: ainda miúdo, aprendi que o Dia da Árvore, 21 de Março, assinala o início da Primavera, mas informaram-me hoje à tarde que não, a Primavera já começou hoje, dia 20!
Afinal, quando começa a Primavera?
P.S. - Ilustro a minha dúvida com o interessante quadro "La Primavera" de Giuseppe Arcimboldo (1573)

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sexta-feira, março 17, 2006

Pobre GNR! Pobres de nós!

Um dos problemas de que, neste chão lusitano, padece a orientação política dos sucessivos governos é ser bastas vezes... desorientada! Não há uma definição clara de prioridades de actuação nem de objectivos que se coadunem com princípios essenciais da vida em democracia e da promoção efectiva do bem público. O que é realmente importante e premente apoiar, desenvolver, financiar, incrementar ou construir, é muitas vezes preterido pelo que é acessório, supérfluo, inócuo e gerador de desperdício.
Vem esta consideração a propósito de uma notícia que li e que dá conta de que o destacamento da GNR do Barreiro se confronta com falta de meios indispensáveis ao normal funcionamento dos seus postos, o que se tem traduzido na contingência de os seus efectivos terem de se quotizar para comprarem resmas de papel e tinteiros para as impressoras de serviço, bem como têm pago do seu bolso a manutenção das viaturas e as botijas de gás para o banho quente de depois do serviço. Na Azambuja houve até um caso de impossibilidade de receber uma queixa por assalto a viatura, dada a falta de papel no posto da guarda! E no ano passado, uma sargento do Regimento de Cavalaria foi mordida por pulgas na arrecadação onde se lavava e fardava, tendo contraído uma infecção de pele...
E reparem que estamos a falar de aglomerados populacionais urbanos, densamente povoados e com elevadas taxas de criminalidade, em plena área metropolitana de Lisboa!
O Presidente da Associação dos Profissionais da Guarda, José Manageiro, assevera mesmo que a dotação orçamental da instituição é insuficiente para pagar as despesas correntes dos postos, havendo alguns cujos computadores em serviço são dos militares.
Apesar disso, e por ocasião dos 94 anos da GNR e por decisão do seu comando-geral, cerca de 1800 gnr's estiveram há poucas semanas em Lisboa, durante dois dias, com 200 viaturas operacionais para um desfile em frente aos Jerónimos. Quanto é que isso não terá representado em termos de combustível (mal) gasto e ajudas de custo?! E ainda assim, o ministro António Costa ousa falar em dificuldades em liquidar vencimentos na GNR.
E agora, a cereja em cima do bolo: no fim de 2005, estes militares foram informados que vão ter de pagar do seu bolso o novo barrete de serviço; 25 euros para enfiarem o barrete!, sendo apenas comparticipados com 5 euros do subsídio de fardamento a que têm direito...
Caros concidadãos, por favor, no caso de serem assaltados, roubados, violados, espoliados, chantageados, ameaçados, atropelados ou baleados, não se dirijam às autoridades competentes, respeitando assim a insuficiência logística das mesmas, que não poderão atender aos vossos pedidos. Em vez disso, dirijam-se a um dos muitos estádios de futebol construídos para o Euro 2004, onde encontrarão milhares de cadeiras disponíveis para confortavelmente se recomporem da violação ou violência de que foram alvo e, já agora, e se resultarem lesões físicas, sarem vocês as próprias feridas da carne, pois é provável que encontrem centros de saúde fechados por falta de verbas para funcionamento. Boa sorte e não deixem de acreditar em Deus!

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quinta-feira, março 16, 2006

Andar na rua, ouvir e não escutar

Multiplicam-se os exemplos que levam à constatação de que andar na rua é, em Portugal (e não será certamente caso único no mundo, mas com o mal dos outros podemos nós bem!), um exercício não apenas físico, motor, mas também de desafio à paciência, ao comedimento e uma exigência de alheamento sensorial, que obriga à simulação de cegueira ou surdez, como se as áreas dos lobos occipital e temporal do cérebro ficassem subitamente inactivas ou deixassem momentaneamente de funcionar.
Da buzinadela que surpreende e assusta à aceleração forçada e a despropósito; do chiar estridente do pneu ao cavernoso e grosso escarro que alveja a calçada; do papel amarrotado e da embalagem amolgada lançados para o chão à beata acesa de cigarro projectada pela janela do carro ou de casa; da insolente e lenta travessia do peão fora e dentro da pass(e)adeira à ruidosa e fumarenta passagem do veículo que transita; do passeio que serve de latrina do dejecto canino e que se aloja na sola do sapato ao despudorado vernáculo foneticamente amplificado, há todo um cardápio de comportamentos que, com a maior probabilidade e facilidade, obtém a imediata comprovação empírica necessária à refutação e eliminação de qualquer dúvida. Aqui, não há lugar para cépticos, basta sair à rua!
E por falar em vernáculo: se as forças e a coragem não me faltarem, ainda hei-de fazer uma antologia de pequenos excertos de dialéctica mundana e profana, recolhidos espontaneamente nas minhas deambulações pelos lugares públicos, pelo que advirto desde já que a linguagem usada poderá ferir a sensibilidade de todos os que habitualmente não saem de casa. Daí a bolinha que figurará no canto superior direito destes posts e o título de «Diálogos Imperfeitos». Simultaneamente, demarcar-me-ei do pagamento de direitos de autor.
A conclusão que se poderá tirar é que há muitos dicionários incompletos em virtude da ausência de entradas: há termos que, de tão banalizados pela oralidade quotidiana, mereciam já a sua inclusão, em lugar de honra, em todas as edições dos livros semânticos de português.
Por ora, por aqui me fico, blindando o ouvido para o combate sonoro a travar.

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segunda-feira, março 13, 2006

O sistema de quotas

Por muito meritórios que sejam os objectivos a atingir, nem sempre se consegue operar uma mudança de mentalidades procedendo por decreto. Creio que é o caso da implementação do sistema de quotas, que pode, na prática, ter efeitos perversos que deviam merecer alguma ponderação.
Desde logo, impor através de lei uma igual distribuição de cargos / lugares entre géneros afigura-se-me uma medida que conduz a uma homogeneização artificial (não natural e não gerada por dinâmica espontânea da sociedade e das suas instituições) que radica em mera conveniência legal e não em genuína convicção e vontade de, sem imposições legais, atenuar as desigualdades provocadas por discriminações sexuais . Aliás, sem quotas temos felizmente vindo a assitir já ao incremento do papel feminino no desempenho de cargos de responsabilidade e liderança - públicos, políticos, empresariais, militares, culturais e noutros sectores de actividade -, papel esse que, em princípio, se tem afirmado de per si, pela sua qualidade intrínseca, e não sob o pretexto de uma medida que privilegia a quantidade em vez das qualificações, capacidades ou perfis curriculares, independentemente do sexo.
É-me indiferente que, por exemplo, o Parlamento ou o Governo tenham 50% de homens e 50% de mulheres, ou que sejam constituídos por mais de um género ou de outro. O importante é que, quem quer que ocupe cargos de relevância política ou outra (Presidente de Conselho de Administração de um hospital ou empresa, ou de Conselho Executivo de uma escola), tenha o perfil e os conhecimentos adequados para o desempenho de tais funções. Penso que nas sociedades ocidentais actuais, de pendor laico e democrático, a tendência para o equilíbrio é inevitável e constatável histórica e estatisticamente. E isso sem haver necessidade de um quaisquer sistemas de quotas.
E se na constituição de uma qualquer equipa decisora ou executiva não se conseguir recrutar um número idêntico de homens e mulheres? E se, por via das quotas, tiverem de ficar de fora pessoas com mérito e competência reconhecidos, para serem substituídos por outras pessoas só pelo critério de género? Valerá a pena atendermos com preocupação legal ao imperativo da quantidade deles e delas, em vez de nos fixarmos na qualidade dos mesmos? Não se estará a combater uma discriminação com outra discriminação?
Por outro lado, embora brote do princípio de discriminação positiva, o sistema de quotas acaba por constituir uma medida secundária, pois a prioridade, no debate sobre as desigualdades sexuais, devia ser proporcionar à mulher condições de participação na sociedade mais humanas e compatíveis com a especificidade biológica que a torna diferente do homem: é o caso dos períodos de gravidez, de amamentação ou de licenças de parto, cujo tratamento pelo dispositivo legal me parece irrealista, por defeito, e, mesmo assim, é factor de desigualdade no acesso ao emprego, na promoção na carreira, etc..
Não quero esgotar o debate, nem isso seria aqui possível. Quero apenas manifestar alguns dos motivos que me levam a não aceitar sistemas de quotas e, simultaneamente, criticar e denunciar casos em que haja discriminação grosseira de pessoas com base no género sexual, seja a favor ou contra este ou aquela. Claro que me satisfaz a igualdade na distribuição do número de deputados e de deputadas que vejo na bancada parlamentar do Bloco de Esquerda e me confrange a desigualdade da bancada parlamentar do CDS-PP. Mas compete à sociedade no seu todo dar mais relevo ao que realmente importa, em vez de criar leis que combatem a discriminação com mais discriminação. É o caso do sistema de quotas.

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sexta-feira, março 10, 2006

«Políticos, Caciques e Outros Anátemas» - 5º Acto

A última edição do Expresso noticiou na sua última página que a Igreja Católica perdeu a gestão da Casa do Gaiato em virtude "de uma auditoria da Inspecção-Geral ter denunciado diversas situações de maus tratos físicos e psicológicos sobre os menores residentes nas diversas casas da instituição".
Infelizmente, esta é mais uma situação que, a acrescentar a tantas outras que com frequência vêm a lume, prova à saciedade a antinomia entre valores defendidos e práticas concretas operadas por parte da igreja apostólica romana. Desde os tempos de predominância papal sustentada pelas fogueiras inquisitoriais, esta instituição, aparente e presumivelmente de cariz religioso, mostra a sua ignóbil face e o baixo carácter de muitos que nela têm (ir)responsabilidades e que, em nome de um poder espiritual, impregna até aos mais ínfimos interstícios os negócios de César que a Deus não deviam segura e teologicamente pertencer.
Trata-se de uma das mais influentes ortodoxias religiosas e, por conseguinte, das mais poderosas, detentora de um acervo patrimonial material ímpar, que a colocam num patamar de visibilidade afinal acima das suas possibilidades efectivas de evangelização consistente, séria, responsável, consequente, altruísta e... cristã! Com tantas riquezas acumuladas e tão contaminada por ambições seculares, a Igreja Católica tem hoje pouco de espiritual e muito de temporal, tentando cinicamente operar uma (ténue) ruptura mnésica com o passado, que nem os pedidos de desculpa a Galileu convencem. E a sua reabilitação tem-se traduzido, de facto, num penoso obscurantismo só dissimulado pela afasia das paredes do Vaticano.
Esta instituição deve hoje a sua sobrevivência mais ao peso cultural da tradição e aos rendimentos (qual capitalista!), do que à acção congruente e proficiente, em conformidade estr(e)ita com a moralidade de que faz apologia. A notícia em apreço, como outras, leva-me à constatação plausível de que a Igreja do bispo de Roma continua inequivocamente eivada de vícios tenebrosos que normalmente se atribuem a instâncias seculares e profanas.
A substituição de um padre por um leigo no cargo de director da Casa do Gaiato, e pelas razões injustificáveis e criminosas que lhe estão subjacentes (haverá apuramento de responsabilidades? Far-se-á justiça?), releva da inadmissibilidade em continuar a violar o legado do Padre Américo. E, para cúmulo da insolência, a diocese do Porto manifestou-se contra a decisão, sob o pretexto de encontrar uma solução dentro do clero que (imagine-se!) mantivesse a pureza original do projecto do Padre Américo. O que esta diocese defende é que se ponham raposas a guardar galinheiros! À hierarquia católica parece às vezes faltar em seriedade o que lhe sobra em austera e insolente indiferença e desleixo pelos mais socialmente desprotegidos.
Haja pudor e que os poderes públicos, neste como noutros casos, ajam efectivamente de acordo com os princípios laicos que devem nortear a intervenção e a acção políticas, e se acabe com os privilégios anacrónicos que são vergonhosa e inconstitucionalmente concedidos por via de "concordatas" e lóbis afins. A esta como a qualquer ortodoxia religiosa. Quem tem fontes de receita incomensuráveis (de que, em Portugal, Fátima é somente o paradigma evidente, por ser a maior grande superfície comercial nacional), não tem desculpa para se fazer passar por mendigo.
Sr. Bispo Ratzinger, Sr. Cardeal Policarpo: não sejam dogmáticos apenas por institucional conveniência; sejam-no também, e sobretudo, por consequente convicção, pois bem prega frei Tomás, olha para o que ele diz e não para o que ele faz...

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quarta-feira, março 08, 2006

«Políticos, Caciques e Outros Anátemas» - 4º Acto

Um outro exemplo recente, do rol quase infindo de exemplos que se poderiam dar, em que as estruturas políticas dos partidos do costume se assemelham a estruturas mafiosas, reside nas entrelinhas de um artigo de opinião de um militante do PS, Rui Namorado, que no Diário de Notícias do passado dia 5 escreve, a propósito do seu partido: "(...) não é admissível a promiscuidade entre a política e os negócios. Quem ocupar posições de relevo no universo das grandes empresas privadas, ou tiver actividades de intermediação em negócios, não deve ocupar lugares de direcção no partido. (...) A independência do poder económico é um princípio constitucional que não pode deter-se à porta do Partido Socialista". Se Rui Namorado tivesse referido nomes de correligionários seus - por exemplo, o de Pina Moura - e publicado o seu artigo de opinião antes das eleições autárquicas de 2005, até que poderia ser considerado como um homem de coragem.
Escreve ainda este professor universitário, que está longe de ter descoberto a pólvora destas perversidades democráticas, que: "A rede dos interesses pequenos e das ambições paroquiais quer reter o PS no seu labirinto", para salientar mais à frente que cabe a José Sócrates (!?) desconsiderar "sem ambiguidades os pequenos feudalismos que aprisionaram a alma do PS". Ficámos a saber, por conseguinte, que: i) estando o PS no seu labirinto, o sentido de orientação dos socialistas é precário e depende mais do improviso de fios de Ariadne que de engenho para ler os sinais em meandros de transparência e lisura na acção política (se eu pudesse, introduziria o minotauro no dédalo fundado por Soares!); ii) a alma do PS está cativa; mas alguma vez a alma do PS, a existir, esteve livre? A cabana do pai Soares pôs o socialismo na gaveta há mais de duas décadas e a tareia que apanhou nas últimas presidenciais são disso um singelo reflexo, mas Rui Namorado já esqueceu aquilo que pretende precisamente lembrar no seu artigo; iii) o PS brinca com os portugueses que nele depositaram a sua confiança, fingindo ou simulando um dinamismo reformista e de acção política, afinal inconsequente e improcedente: "O PS não pode continuar no seu labirinto. Por isso, nem pode ficar paralisado pela inércia das rotinas, nem deixar-se possuir por qualquer sofreguidão na procura de uma saída. Mas principalmente não pode cair na tentação de fazer de conta que anda para não sair do mesmo sítio", refere o professor de Coimbra.
Está explicado nesta peça de teatro, que vai no seu 4º acto, por que motivos Portugal é uma espécie de Albânia da União Europeia. Mas também está explicado que o exemplo português é indissociável da ideia de que a democracia é apenas o menos mau dos sistemas políticos, cujas virtudes só se optimizam deveras em sociedades bem informadas, instruídas, críticas e com membros efectivamente responsáveis e sérios, avessos à cunha compensatória e ao silêncio cúmplice que quase parece corajoso. Há que acabar com este sistema de que «são todos bons rapazes».
Até quando se manterá válido o aforismo: as moscas mudam, mas o excremento é o mesmo?

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terça-feira, março 07, 2006

«Políticos, Caciques e Outros Anátemas» - 3º Acto

Não, os episódios recentes que atestam o obsceno conflito de interesses que atiça militantes dos partidos do costume uns contra os outros, ainda não acabaram. Outro exemplo, que faz do PSD um genuíno ninho de cucos, vem do suave sopro de peçonha com que Luis Filipe Menezes (não percebo por que razão esta criatura não assume o Lopes final!?) insiste em contaminar o ar que se respira no seio do seu partido, cuja atmosfera é letal para qualquer asmático.
O edil de V. N. Gaia insinuou recentemente que Marques Mendes só se mantém como timoneiro da débil canoa laranja à custa de lóbis internos que o favorecem. Assevera Luis Lopes, perdão!, Luis Filipe Menezes que: "Cada um é protegido como é. Há grandes grupos de interesses que promovem alguns até ao céu e decretam a presença eterna de outros no inferno." Mais palavras para quê? Deve ser mais difícil encontrar diferenças entre o PSD e uma organização mafiosa, a julgar por estas apodícticas e diabólicas afirmações do autarca gaiense, do que ganhar o jackpot do euromilhões.
Assim, quem duvida que o PSD quer defender os interesses de Portugal? Pena que Luis Filipe Menezes não tenha aberto um pouco mais o horizonte discursivo, justificando com nomes os perigos e animosidades que minam a seriedade e honestidade dos políticos social-democratas. As palavras pouco abonatórias e delatórias proferidas contra o seu próprio partido ainda dariam um caso de polícia, se não estivessemos em Portugal...
P.S. - Ver edição nº 333 da revista Focus.

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segunda-feira, março 06, 2006

«Políticos, Caciques e Outros Anátemas» - 2º Acto

Ainda a propósito da declaração de Macieira Coelho, esta foi criticada pelo presidente da Comissão Política do PSD de Oeiras, Alberto Luz, que a considerou "extemporânea e injustificada". A réplica de Macieira Coelho a Alberto Luz é assustadoramente contundente e dispensa comentários: o primeiro acusa o segundo de se ter deixado silenciar por Isaltino a troco de uma recente nomeação de Luz para (o patriótico cargo de) assessor jurídico dos SMAS locais, com um salário de uns parcos 2600 euros mensais (líquidos?).
E como se este imbróglio não fosse já suficientemente demonstrativo do tipo de gente que povoa e se acotovela nos partidos do costume, e em que os portugueses persistem masoquistamente em votar, entra em cena o próprio e exaltado Isaltino Morais, contra-atacando os seus opositores internos ao remeter as responsabilidades pela gestão danosa da autarquia oeirense para Teresa Zambujo, nem mais nem menos que outra social-democrata e ex-aficionada e ex-membro da equipa de Isaltino em anterior mandato; Zambujo e o seu executivo são acusados de "irregularidades e ilegalidades".
Mais uma vez, a culpa é uma senhora que morrerá solteira! Ai se os rabos de palha ardessem...
O pensamento inconfessável dos militantes dos partidos do costume parece coincidir com o vitupério de uma varina que conheço que, referindo-se aos políticos que por ela passam em campanha eleitoral, assevera prosaicamente: "O que vocês querem é tacho!"
P.S. - Claro que esta varina não existe...

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«Políticos, Caciques e Outros Anátemas» - 1º Acto

No dia 20 de Fevereiro, na Assembleia Municipal de Oeiras, o deputado social-democrata António Macieira Coelho apresentou uma declaração política a exigir ao presidente da câmara, Isaltino Morais, que se demitisse, na sequência das acusações dirigidas pelo Ministério Público: a Isaltino são imputados os crimes de corrupção passiva, branqueamento de capitais, abuso de poder e fraude fiscal (só faltava acusarem-no também de homicídio e invasão de propriedade!).
Porém, e numa atitude só compreensível no contexto do que se pode designar «coerência partidocrática», tão habitual entre os políticos dos partidos do costume, o deputado Macieira Coelho não votou a favor (absteve-se!) das duas moções de censura, apresentadas pelo Bloco de Esquerda e pelo Partido Comunista, contra o presidente da autarquia. Embora considere que "o mandato [de Isaltino] está inviabilizado, por uma questão de conduta moral", este inaudito deputado da secção de Algés acrescenta ainda, paradoxal e surpreendentemente, que "Isaltino devia abdicar do cargo por livre vontade e não devido a uma imposição".
Então, que sentido e pertinência tem apresentar uma declaração política exigindo a demissão de alguém, se simultaneamente se defende que a demissão deve ser voluntária e não imposta?
Senhor deputado Macieira Coelho: demita-se você e oxalá o outro o acompanhe!
P.S. - Sobre este assunto, ver a edição nº 333 da revista Focus, pág. 22

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quinta-feira, março 02, 2006

Confiança política ou eufemismo para partidocracia?

Li ontem num jornal que, desde a vigente rósea governação socrática, o Estado já gastou milhões de euros em indemnizações a directores e administradores gerais de empresas públicas que entretanto foram demitidos pelo executivo ao longo do último ano. Motivo: falta de "confiança política", os mesmos são uma herança dos (des)governos anteriores, uma espécie de intrusos que compareceram numa festa sem serem convidados. Vai daí, há que despachá-los a peso de ouro, sob o pretexto de carecerem de "confiança política".
Neste particular, Sócrates segue as pisadas dos seus antecessores...
Sempre que há uma zanga de comadres ou as eleições dão o exercício do poder a outro partido (e mormente tratando-se de maiorias absolutas), já se sabe que magotes de seguidistas do aparelho partidário ganhador são nomeados para cargos públicos bem remunerados, substituindo antecipadamente outros seguidistas de cores dissonantes que são arbitrária e inapelavelmente demitidos (ou convidados à demissão!). Imagino a tristeza destes: não poderem concluir o mandato para que foram nomeados e ainda por cima verem-se na contingência de terem que receber milhares de euros do erário... Que gratuita ingratidão ao seu espírito de missão!
Outro dado curioso é que os recém-nomeados são, em muitos casos, ex-ministros, ex-secretários de Estado, ex-edis, (ex-)deputados, e outros que também se tornam "ex" qualquer coisa para melhor serem recompensados pelos "altos serviços" prestados ao partido. Este é o mérito que muitos deles têm e daí lhes advém a inquestionabilidade do carácter e extremosa competência. Quem põe em causa o elevadíssimo espírito de missão à causa pública de, por exemplo, Armando Vara, Fernando Gomes ou Oliveira Martins? O que seria de Portugal sem eles? Quem estiver politicamente incólume que lhes atire a primeira crítica... [Ooops, calma, não se atropelem; vá lá, intervém um de cada vez!]
Estes comportamentos quase obscenos que consistem em premiar o carreirismo partidário como fundamento e valor preponderante da acção política, tão típico dos sucessivos governos, não deviam ter o silêncio tantas vezes cúmplice dos 'media' e da opinião pública, que às vezes parecem acomodados e até interessados no vai e vem de nomeados e demitidos. Porém, reconheço que para certos altos cargos da administração pública os governantes precisem de "funcionários" que garantam a suficiente e necessária confiança política que permita assegurar o cumprimento das directrizes e orientações (quando por sorte as há!) delineadas pelo Governo. Mas quantas vezes os nomes aventados e até designados estão nos antípodas das qualidades idealizadas para o exercício de tais cargos?... Há demitidos que, pelo menos aparentemente, lá iam gerindo as naus públicas e que, subitamente e sem explicações plausíveis, são impedidos de continuar a fazê-lo, com o pretexto da confiança política, que é o mesmo que dizer: "o meu cartão de militante é mais bonito que o teu".
Perante isto, como se pode falar em controlo eficiente e efectivo do défice das contas públicas e exigir aos cidadãos que se conformem com a subida de impostos, congelamento de progressão nas carreiras e regras apertadas (e estranhas!) de promoção profissional na Função Pública?
Porém, há um aspecto que reconheço igualmente: se eu sei desta perversidade democrática, a generalidade dos portugueses também sabem e, verdade se diga, este Governo e os anteriores não tomaram o poder através de um golpe de Estado...

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